segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Retorno


Digo-lhes que não há nada no mundo externo que não esteja ligado ao meu mistério. Minhas conexões vão além do simples entender racional. Há uma sábia bruxa que os lê para mim. Sei que a cada passo que dou é de encontro à minha alma. Por vezes relutei, mas sua voz rouca e engasgada não deixava de roçar meus ouvidos... E meus mistérios me levaram a estradas distantes do concreto. Por vezes, queria acreditar estar sendo enganada, mas não... A velha me contou que para encontrar os aspectos sombrios é necessário sair um pouco do caminho. Saída estratégica para reconhecimento da força primeva. Saí, mas retornei. Não sou vitima de nada, apenas constelei o que dentro havia, para me libertar e criar poesias.

Ana Flávia Rocha

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Porvir


Por quantas vezes teremos de nos despedir para certificarmos que existe amor?
Quantas lágrimas terão de ser derramadas para regar o que sobrou?
Resistirá todo o sentimento que um dia nos embriagou?
Esse tempo que molda e muda e transforma poderia agora parar
Preciso de uma pausa para respirar
Pare o tempo, antes do ano se iniciar
Pois ainda não sei o que sonhar...
Mas a lua brilha no céu e ilumina a noite escura
Ela não sabe que a luz assusta
E que o porvir é poesia de gente maluca...

Ana Flávia Rocha

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Cavalo, galope de expansão


Pergunto ao meu cavalo selvagem - Para onde queres ir?
Ele responde em relinchos e passos largos
Que quer ir a uma vida nova, sentir-se pertencido em liberdade,
Conhecer gente, mares, terras, sabores, apoiar lutas,
Transformar realidades, transformar-se, amar, o amor em si
Em seu sentido mais amplo, mais forte e mais desconhecido
O que ele quer é voar....

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Abismo

Então, depois de tudo isso, podemos concluir que...
... não há conclusão, só há mistérios...

Pois a vida é uma pilha de longa duração
Uma eterna excitação, sem entretenimentos modestos
Uma afetação contínua, cheia de dor e alegria
Um caminhar eterno na beira do abismo
Um extravasamento dos excessos
Aprendi o risco de estar viva desde o início
Vivo no abismo, abismada com a vida

Ana Flávia Rocha


terça-feira, 20 de novembro de 2012

Fugiremos

O verbo que inspira e faz crer
Que encontraremos um caminho para crescer
É um verbo conjugado na primeira pessoa do plural
Ungido de corpos que não temem se perder
E quando perguntei de quem fugir, ele respondeu:
Fugiremos do tempo!
Fugiremos das certezas!!
Fugiremos do esperado!!!
Fugiremos, de mãos dadas...

Ana Flávia Rocha

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

O tempo e o vento

De mim, criei uma memória estática e idealizada
Morri no passado, me abstraí no futuro
Doeu: mergulhei em outro mundo
Temi a morte, temi a vida
Neguei meu corpo e meus desejos
Neguei a mim e me desfiz...
Foi preciso tempo
Para me reinventar
Reinventar-me é tempo
Sou no tempo
Um instante, um momento, um movimento
Um sentir misterioso, um medo dispendioso, um caos doloroso
Uma tragédia silenciosa e solitária
Trafego nesse tempo que não se importa com a memória
A vida é e está sendo
E eu, no vento...

Ana Flávia Rocha

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Vestindo o tempo

Eu queria viver de poesia, e sei que isso nunca vai acontecer
Talvez um dia, quando eu estiver velhinha, eu venha a viver só de escrever
Mas esse tal de “talvez um dia" é uma mania de quem não sabe viver
Descobri com Nietzsche que somos escravos desse dever ser
Pobres humanos que busca a segurança por medo de morrer
Mas a vida é grande e misteriosa e nos engole sem perceber
A vida é breve!!! E o sentido nós que temos que fazer
Hoje, aqui, agora, mergulhados no divino de somente ser
Ai que duro destino é esse da poetiza que não quer crescer
Que não quer ver que a vida é só isso, e que vou morrer
E sempre que meu olho espia o vazio, sinto frio
E volto a pensar que devo ser uma cidadã respeitável
Uma mulher honrável, uma máquina de fazer
Mas ainda bem que há o corpo, há o prazer
Há livros, músicas, filhos e amigos
E, sobretudo, os sonhos que me distraem desse cruel destino
Tecendo uma vida mítica e cheia de desatinos
Para cumprir, enfim, o meu destino.
Mas, qual mesmo é o meu destino?

Ana Flávia Rocha

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Faz de conta....

Faz de conta que já se passara o tempo necessário para o meu coração esquecer que um dia bateu forte por uma dor de falta... faz de conta que, nesse tempo, o meu coração aprendera que a falta era necessária para se chegar onde se deve chegar... faz de conta que esse lugar onde se deve chegar esteja mais perto do que eu possa imaginar... faz de conta que nesse lugar não exista saudade... faz de conta que eu seja corajosa o suficiente para me refazer para um novo faz de conta...

Ana Flávia Rocha

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Rio


O Rio tem o seu cheiro... O rio tem o nosso cheiro
Cheiro de momentos de desespero por você
Cheiro de momentos de alegria com você
Cheiro de delirios lisérgicos e raiva por nada ter dado certo
O Rio tem a sua textura... O rio tem a nossa textura 
Tatear a maresia que paira no ar é tocar nas lembranças cheias de prazer que todo inicio tem 
É acariciar o desespero de um fim cheio de lamentos
É sorrir e chorar frente aos acontecimentos
O Rio tem o seu sabor... O rio tem o nosso sabor
Sabor do sal, do sol, da pele lisa e morena, do chopp gelado do boteco de rua de qualquer esquina
Sabor de esperança compartilhada
Sabor de saliva estancada no meio da garganta por não conseguir engolir mais nada
É na beira do rio que arremato os finos fios que teceram nossa história
Escorre por entre as lembranças dos sentidos um Rio de outrora

Ana Flávia Rocha

sábado, 20 de outubro de 2012

Um Ser Curioso

Minha essência não é só de urgências
Minha essência não é só de carências
Há algo maior que desperta uma chama e me movimenta
Em direção a um ponto natural
Talvez uma pitada de interesses misteriosos
Ou somente um querer saber além do planejado
E quando não estou mais no controle
Deleito-me e me entrego ao inesperado
Enfeita minha essência um curioso animal
 
Ana Flávia Rocha



sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Meu filho

Meu filho é um menino azul

Que solta pipas multicoloridas

No céu avermelhado de Brasília

Meu filho carrega em si o grão da vida

Fonte geradora da certeza

Que de minhas entranhas nasce a beleza

Olhá-lo é aprender

Criá-lo é crescer

Admirá-lo é crer

No florescer constante dos dias

Meu filho é um mistério profundo

Ancora no mundo

Matéria prima de poesia e grandeza



Ana Flávia Rocha

domingo, 14 de outubro de 2012

Já devia estar aqui


Essa noite preciso do teu beijo, da tua língua, da tua pele e algo mais
     Essa noite pesa a tua ausência, cheiro teus sabores, sinto tua sombra e meu peito pesa pequeno, apertado, derretido...
        Essa noite tudo que é matéria em mim grita teu nome
               Essa noite preciso do teu folêgo, do teu fogo, do teu colo, não me calo
                    Essa noite preciso só de ti...

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Na pista

Basta, já não te quero
Tu és um néscio
Um mero pós-marxista...
E meu coração, caro amigo,
É anarquista
Só se inflama quando está na pista.

Ana Flávia Rocha

sábado, 6 de outubro de 2012

Seu cheiro

Seu cheiro doce e azedo
Impregnado em meus cabelos
Lembra corpo, lembra os gozos, lembra mãos
Seu cheiro de gente
Perfume perene
Lembra casa, lembra os dias, lembra poesia
Seu cheiro na memória
Odor suave de outrora
Lembra fantasia, lembra os sonhos, lembra ilusão
Na memória dos sentidos, vagam as palavras
Se lavo meu corpo, perco seu cheiro
Se durmo suada, seu cheiro se espalha

Ana Flávia Rocha

domingo, 30 de setembro de 2012

Eu não durmo

Ele me perguntou se não dormia mais
Não, durante a noite eu não durmo
Perambulo livre dessa carne que envelhece
Alma solta da razão
Eu me enrosco nas peles dos corpos suados das putas
Expostas nas ruas
Sentindo em seus desejos tudo aquilo que minha moral repugna
Mas jamais esquece
Não, durante a noite eu não durmo
Eu fumo o ópio proibido dos amantes
Busco satisfazer os desejos velados
Não me furto ao horror das vontades – sem pudores
Vago nesse mundo impregnado do cheiro azedo do pecado
Não, durante a noite eu não durmo 
Caminho por entre os esgotos onde crianças e ratos dormem
Cheiro o lixo podre que guardo nas entranhas dos canos que minha pele encobre
Lambo os suores dos homens que vagam por entre os sonhos
Eu só durmo quando acordo
Jeito bom de suportar as deslisuras que carrego
O meu pecado que não vela – e revela minha vida quando acordo

Ana Flávia Rocha

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Oração

Deus, não deixe eu morrer sem me conhecer
Dê-me sentido a esse mistério de estar viva e saber ser
Que eu não tema minha essência que é despida de pudor
Do corpo que abriga os meus desejos, faça que o trate com amor
Que eu não lute contra nada que insurja em meu peito
Das dores e alegrias passageiras, faça delas minhas fieis companheiras
Que eu não fuja da minha natureza, que ainda não sei o nome
Dos sentimentos desconcertantes, que eu os carregue sem culpa
Dê-me sempre a inspiração como guia
E a fé de que um dia, a ti ou a mim, eu encontrarei no fim dessa jornada
Deus, não deixe eu morrer sem te reconhecer...



Ana Flávia Rocha

sábado, 22 de setembro de 2012

Cacos

Não me queira, não te farei bem
Destilo raiva e rancor
E meu poder de sedução, amor, é só uma armadilha...
Não me queira, estou machucada
E meu processo de cura, se é que há, talvez seja eterno
Mas pode ser que um dia, talvez....
Hoje não consigo amar além da poesia
E meus gozos são solitários
Não me queira, não sou de ninguém
De quem sou?
Da minha imaginação, que me leva a ser rainha e rata

Tirana e princesa, bruxa e mulher...
Amor, só há uma certeza dentro de mim
De tão alijada de meu destino, me tornei alheia ao meu caminho
Por isso, não me queira
Pois hoje trilho uma estrada cheia de cacos

Pedaços largados que precisam ser...
...algo que desconheço, mas que precisam ser....

Ana Flávia Rocha

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Fogo

Sou uma mulher dada a rituais
Acostumei-me a transmutar assim
E à medida que o fogo aceso do meu altar aumenta
Morrem em mim os sonhos e ilusões
Essa chama que crepita no ponto largo e escuro da alma
Ilumina o que sempre escondi de mim:
Nuvens negras que passeiam numa noite enluarada
Não fujas, sombra maldita e abandonada
Pois hoje és querida e desejada
Por alguém que mal conheço
Mas que, cuidadosamente, alimenta esse fogo

Esses dias, essa sombra, esse nada


Ana Flávia Rocha

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Lírios

És tu que me alimenta nessas noites cinzentas
Que choro a ausência de um amor tardio
Surgido de um campo cheio de lírios
Apareces do nada, trazendo nas mãos doces palavras
Enchendo de ternura meus pensamentos
Acompanhando nessas desventuras
A saga de uma mulher pintada
Pela tinta viva da ilusão

Largada no meio da estrada 

Ana Flávia Rocha 

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Se...

Tudo seria muito bom se as coisas fossem diferentes do que são
Certamente seria muito mais legal se outra mulher eu fosse
Mas o melhor ainda seria se as pessoas agissem na medida exata do meu querer
Mas não sou, e nem as coisas são diferentes do que se apresentam
E muito menos as pessoas estão aqui para me satisfazer
E me coloco diante dos meus desejos
Qual criança mimada, que se apega ao nada, só para não crescer
Qual menina tirana, que não consegue ver mais nada além do seu querer
Insano é sofrer por não ter aprendido que o mar não se pode ter


Ana Flávia Rocha

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Meu amor

Meu amor, não te entristeças, abra os olhos e veja
O mundo é mágico, e a morte que te persegues é a vida que se segue
Não chores por não ter o que queres, alegre-te com que tens
E tens tanto, tens a mim que estou sempre ao teu lado
Meu amor, não vês que já é tarde para desistir desse querer
Os desejos, que são tantos, já não te causam espanto
És grande e forte para receber da vida toda a sua sorte
E só eu nunca te deixarei
Meu amor, não temas diante de teus dilemas, já estás perto de sua glória
Já chegastes até aqui, por que desistir?
Vamos brindar com alegria os dias que estão por vir
E, apesar do espanto, agradecer esse grande encontro
Que nos une até o fim

Meu amor, prazer em te reconhecer

Ana Flávia Rocha

domingo, 19 de agosto de 2012

No caminho do sem fim

No caminho do caminho do caminho do sem fim
Eis que encontro uma ideia brilhante
Desenhar nas areias do mar o meu nome
E deixar que a onda o derreta
Levando-o como se leva o nada
Para longe de mim
Pois se julgo ser somente um nome num corpo
Lembro que um dia terei um fim
Pois se julgo que é no caminho que me reconheço
Lembro que sempre há algo renascendo em mim
Mas que tremenda confusão para quem somente chegou à conclusão
De que viver é morrer
De que a morte é um renascer constante
E a vida um ciclo sem fim

Ana Flávia Rocha

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Às vezes...

Às vezes ele não entende que meus desejos são urgentes
Bastando poucos minutos de ternura para que eu me desfaleça
Nos longos braços que arrematam meu corpo frágil
Às vezes ele não entende que meu corpo só o deseja
Que pouco importa o que ele pense, pois o torno sempre atraente
Quando meus desejos estão úmidos e latentes.
Às vezes ele não percebe que finjo escutá-lo com atenção
Que empresto meu olhar, meus gestos e pensar...
Mas que no fundo fico somente a imaginar
O seu corpo ardente, sua boca quente, suas mãos ligeiras e meus desejos repletos de anseios.
Às vezes ele não vê o quão importante para mim são os pequenos momentos de prazer
Mesmo que rápidos e monossilábicos, mas intensos no satisfazer.
E no meio do caminhar amigo ele me convida a saciar
Minha fome que não tem nome, com uma pipoca doce e salgada
Que, apesar de desejada, me faz crer que talvez a melhor comida
Seja sempre a imaginada...


 

Ana Flávia Rocha

PRESTA ATENÇÃO!

Presta atenção!
Que tem gente falando por ai...

Falando da sua dor...
Falando do seu amor...

Presta atenção!
Que tem gente.

Gente que sente...
Gente!

Presta atenção!

(Ana Barros)

domingo, 12 de agosto de 2012

Alice

O coelho de Alice avisava a hora exata
Do encontro marcado entre ela e o nada
E na hora planejada por sua alma preterida
Eis que encontra Alice a lagarta sabida
Tragando questões até então nunca pensadas
E foram embates marcantes e descabimentos profundos
Que fizeram desse sonho um encontro fecundo
De uma Alice que dormia para outra que acordara
Com a lembrança de um chapeleiro maluco
E de um mundo que profetizara
Que o bem e o mal sempre caminham juntos
Numa tarde ensolarada


 

Ana Flávia Rocha

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Lobo Mau

Que mistério é esse que invade meu corpo
Me deixando assim, cheia de desejos descompensados?
Que odor é esse que de repente sinto no ar
Despertando um olfato cheio de curiosidades?
Que olhar é esse que só enxerga o belo, o que arde
O que está pronto para ser atacado?
Que tato é esse que faz com que minhas mãos busquem
Um caloroso contato?
Acho que entrei no ciclo da procriação
E o que chamam de lobo mau é somente meu instinto

Me comendo pelas beiradas...

Ana Flávia Rocha

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Amigas

Confesso que o meu grande amor são vocês, minhas amigas, que me resignificam com gestos, atos, palavras, desenhos e poemas
Confesso que nunca havia pensado, na vida, que seria surpreendida com tal sentimento
Confesso que experimento agora um amor que é alimento e que faz nascer novas emoções, visões e pensamentos
Confesso que não seria quem eu sou se não houvesse vocês nos meus melhores e piores momentos
Confesso que quando olho para o firmamento agradeço a vida por tamanho privilégio
De ter nascido mulher e poder abraçar, acarinhar e beijar todas vocês, sem o menor julgamento
De caminhar nessa estrada sempre acompanhada por grandes mulheres

Que me ajudam a morrer e renascer - nesse eterno crescimento

Ana Flávia Rocha

segunda-feira, 30 de julho de 2012

PÉITOS ...




Peito aberto, pé na estrada...
A vida é o caminho que desbravo
Com choro, com riso
E com esperança que a humanidade vai aprender a construir
Rumos mais justos
Amores mais vivos
Filhos mais livres
Igualdade, Liberdade, Diversidade
e Fé na vida!



Edição: Ana Barros
Poesia: Valéria Burity
Produção: Quintal Virtual

domingo, 29 de julho de 2012

Fricção

Solta o verbo para iniciar a ação.
Vai fazendo no seu tempo
para não atrapalhar a execução.
É na fricção do subjetivo com  o objetivo 
que se constrói uma nova conjugação.


Ana Barros

Maniuebiab´y

É que meu olhar despejou em ti um adorno, divino
E ja não via o traço, a cor, o pelo
Mirava apenas teu aço, tua dor e meu espelho...

Valéria Burity

Releituras

Às vezes, quando te leio, percebo um estranhamento profundo
Você na superfície e eu no fundo
Olhando mais de perto, sei que há algo mais concreto
Sua vida mais aberta e a minha mais secreta
Outras vezes eu fecho os olhos e sinto tudo ao contrário...
Eu por cima e você por baixo


Ana Flávia Rocha

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Sertão, coalhada de sentimentos

E por, às vezes, me sentir tão d i s t a n t e de mim é que me entristeço
Quando me esgarço, não me reconheço 
Quando me perco, quando tenho saudade do que está por vir...
Uma busca infinda, ainda desconhecida, no aqui e ali de mim
Saber-me só, não saber-me, não saber, não...
Desmesurado sentir, viver contido,espremido entre razão e o medo da solidão,
Da companhia, da velhice, da responsabilidade, da loucura e da morte
Coalhada de sentimentos, expansão de dor
Quando ser é só espelho da pretensão
Mas não há desespero, consola Riobaldo no sertão que trago em mim
“Porque aprender a viver é que é o viver mesmo”...

Valéria Burity

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Conclusão

Quão dementes e lascivos são os desejos de quem sente a solidão
Pensamentos preenchidos de fantasias e ilusão
Que despertam mil possibilidades de viver uma paixão
A dois, a três, a quatro...
Fazendo dos conhecidos fieis desconhecidos
Inventando quem representem pais, primos e irmãos

Quão culpada me sinto quando penso nas proibições
Fui isolada e castrada das sensações
Que brotavam naturalmente
Na mente inocente
De uma pequena menina
Que gostava de brincar sozinha

Ana Flávia Rocha

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Anjo Exterminador

Entre com cuidado nessa casa.
Há algo maior que nos chama.
Reverenciemos os acontecimentos
Eles são oportunos
Mesmo diante dos desentendimentos.
Poderia te receber de um jeito sedutor. Mas não...
Venha, tenho algo a oferecer além da sedução
Deixe que eu tire seus sapatos, suas calças, sua blusa.
Deixe que eu o deite em minha cama.
Quero te olhar nos olhos e te agradecer.
Deixe eu te tocar num gesto de entendimento dos meus sentimentos.
Deixe eu te acarinhar, pegar nos seus cabelos,
Cheirar seu pescoço, olhar profundamente os seus olhos.
Deite-se e deleitei-se com esse amor contido e há tanto tempo guardado.
Se desperta em mim um lado compreensivo
Que precisa te ver para me conhecer...

Ana Flávia Rocha

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Ai meu deus

Ai meu deus,
Não vês que teus remédios não me servem mais?
Já não faço parte das mulheres normais
Por isso eu te peço, por favor,
Afaste-se com seu temor
Pois quem em mim habita é a eterna diva
Deusa fecunda e de louvor
Minha natureza é feminina
Digna somente de amor


Ana Flávia Rocha

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Perguntas

Qual o preço que pago por ser uma mulher assim:
Tão descoordenada e viciada?
O que me faz crer que posso mudar a minha natureza?
Meu amor: o que faço com ele?
Qual a medida do meu ser?
Qual ritmo irá compor meus sentimentos do momento?
Qual melodia faz parte do meu poema?
Transito nos ritmos do querer
E são tantos, tão efêmeros e tão meus
São ditados como pulsações de uma sensação que não tem fim
São vivos como eu sou... Cheios de sentimentos e ardor
Enquanto isso minha gata pula pela casa
Mostrando que o sentindo de estar e ser
Não passam de simples momentos de prazer

Ana Flávia Rocha

domingo, 15 de julho de 2012

Formiguinhas

Quando entrei na casa vazia
Deparei-me com um clã de formiguinhas
Elas zanzavam noite e dia na cozinha
Gostei de encontrá-las nos cantinhos da casa
Sentia-me mais acompanhada
Com o tempo, passei a observá-las sem querer extirpá-las
E pensava no sentido delas em minha vida
Hoje já não as vejo mais zanzando por aí
Às vezes me deparo com uma no açucareiro cheio
Outras vezes no pote de mel vazio
Talvez elas estejam escondidas, se acolhendo do frio
Ou talvez não...
Talvez elas estejam apenas cumprindo o destino
De irem embora à medida que as dores se vão


Ana Flávia Rocha

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Desmesuras

Não tente compreender minhas desmesuras
São desmesuras desmesuradamente itinerantes
Mostrando-me que tudo que sinto é pura ilusão
Minhas desmesuras não tem nome
Não tem parâmetro e nem cor
Não tem começo e nem fim
E geralmente são destituídas de rancor
São acompanhadas de sentimentos grandiosos
Mesmo que depois se apequenem
Diante do quase nada que significou
Minhas desmesuras não pedem licença
São feitas de pequenas urgências
Aparecem do nada e me levam a lugares inexistentes
Não tente compreender minhas desmesuras
Mas saiba que elas acabam por desmentir
Tudo aquilo que julgo sentir


Ana Flávia Rocha

terça-feira, 10 de julho de 2012

Menina

Ainda menina, fui ferida na vagina
Negando minha autonomia e energia
E todas as vezes que a sentia pulsar
Olhava para fora com medo de não me controlar
Encarnei meu controle nos falos que tentei possuir
Investindo no estigma de ser boa menina
E agora me olho no espelho e não me reconheço
Não sei quem esse corpo habita
Não há harmonia entre meus desejos
E sinto como se minha casa estivesse vazia...
Tive tanto medo do meu fogo
Que ele acabou por consumir
Toda minha alegria


Ana Flávia Rocha

segunda-feira, 9 de julho de 2012

sem título

Quando resolvi ser honesta comigo
Senti um nó no estômago
Não sabia que carregava dentro
O que fora me oprimia
E os sentimentos julgados importantes
Foram perdendo força, cor, luz e vida


Quando resolvi ser honesta comigo
Abri meus olhos num breu profundo
As vozes se calaram subitamente
Dando espaço ao profano abraço

Dos desejos oprimidos
Entre deus e o diabo.



Ana Flávia Rocha

terça-feira, 3 de julho de 2012

Belo estranho...

Quero hoje me enfeitar para você
Colocar em meu pescoço colares de contas coloridas
Nas orelhas, brincos de prata e cristal
Nos dedos, anéis que simbolizam a aliança
De todos os compromissos que ainda faremos
De sermos um nesse nosso momento
Quero hoje me fazer bonita
Dançar e cantar contra o vento morno
Que traz a brisa e o consolo
Do desamparo que me guia
Para seus braços que acariciam
A nova mulher que se inicia

Ana Flávia Rocha

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Na segurança da insegurança
abri um caminho
que rasgou a trama
que impedia o reflexo 

o reflexo da realidade.

(Ana Barros)

De que nós somos feitos?

De que nós somos feitos?
Carne e osso e desejos
Sonhos e ilusão
Que caminham na imensidão
Somos feitos de pensamentos
Peitos, bundas e cinturas
Que nos levam na aventura
De sermos um
Dentro de nossa solidão

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Sonhos



Dizem por aí que os sonhos curam
Dizem, e foram doutores que disseram, que os sonhos revelam
Muito mais do que ocultam, nossos mistérios
E nos sonhos nos refazemos e resignificamos
Tudo aquilo que fora não suportamos
Dizem por aí que os sonhos ajudam
A desfazer o que cremos ser
Lutamos contra monstros, corremos de bichos e nos afastamos
Do inimigo oculto que guardamos.
Dizem por aí que quem sonha é feliz
Pois há sonhos que nos fazem lembrar
Da alma amiga que nos guarda ao acordar

Ana Flávia Rocha

terça-feira, 19 de junho de 2012

Aflição

Por que da dor me fizeste assim tão pequenina? tão impotente perante meus pensamentos - turbulências constantes de dizeres alheios... não sofro por ser quem sou, mas sofro por pensar que devo ser quem ainda não sou... e me sinto tão pequena diante da solidão do meu quarto vazio, grande de memórias de um trato que fiz nem me lembro mais com quem... vendi minha alma, e não sei como recuperá-la... mas guardo na prateleira  a caneta que rabiscou com sangue o meu nome, num papel sem pautas e vazio de letras...  Por que na dor me sinto tão pequena? tenho medo da vida e dos tantos outros tratos que ainda tenho que desfazer... tenho medo do grito que ecoa por toda a casa - me guiando, me seguindo, me pertencendo – mesmo que eu não queira... e sou tão pequenina que não vejo mais lugar para tantas coisas que extravasam, alheias a mim. E de tão pequena assim, onde guardarei as grandezas da vida que me pertencem, mas que ainda as ignoro?

Ana Flávia Rocha

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Sabedoria de Terreiro

Na gira de terreiro
Preto velho me falou
Pra que se preocupar?

Há que se ter fé na vida
O que eu não sei,
Ele sabe, e isso bastará
Pra que se lamentar?

Há que se observar a natureza
O rio corre em uma só direção
O que foi, não voltará

Pra que lutar?
Há que saborear os momentos
A dor é como laranja,
Se chupada até o fim
O que sobra é o esquecimento
E ao som dos atabaques
Preto velho me contou
Que o amor só vale a pena quando há troca
E que o tempo é o acalento da alma


Ana Flávia Rocha

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Estrada

Como saber o que se sente
Frente ao temor crescente
Do erro e do destino
Finitude de um corpo
Que carrega uma mente
Ocultando os mistérios divinos
E na desordem da alma
Metade telúrica, metade celestial
A lógica da mente, o poder do amor
Metade pássaro, metade serpente
Os vícios latentes, a dor de quem nunca chorou
Águas correntes, águas estagnadas
E nessa estrada rumo ao nada
Sei que tudo é belo, tudo resplandece e tudo passa


Ana Flávia Rocha

terça-feira, 22 de maio de 2012

Revelia

Não tenho medo de meus processos,
Encaro-os a fogo e ferro
Não me venha falar o que devo fazer agora
Sempre estive sozinha nessa estrada
Fingia precisar de você pra me sentir mais amparada
Espectros de uma alma fragmentada
Despedacei-me, perdi-me e sigo
Mas o desamparo foi meu maior amigo
E por mais louca que pareça ser,
Olhe-me bem, e veja quem me tornei
À sua revelia me fiz forte e inteira
Digna e verdadeira
Capaz de carregar minhas feridas
Entregando-me ao eterno delírio
De sentir-me mulher, e mais nada...

terça-feira, 8 de maio de 2012

Frio

Por favor, não vá embora
Fique, já perdi tantas coisas nessa vida
Deite-se ao meu lado
Consuma-me com seu frio
Provocando-me arrepios
Venha, me abrace
Acalme minha agonia
Não lutarei contra nada
Entrego-me na noite e no dia
Traga o breu da solidão
Lucidez e desatino no coração
Venha, não negarei minha sorte
Sou sua até a morte

Ana Flávia Rocha

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Isqueiro Vermelho

Pegue na minha mão
Vamos mergulhar nos mares da ilusão
Onde nos fundiremos por completo nas incertezas do coração
Assim saberás que meu corpo é a extensão de meus desejos
Com ele eu toco, lambo, danço e planejo
A melhor vestimenta que posso carregar
Um vestido esvoaçante, cheio de cores,
Dando espaço às minhas pernas que bailam ao som das inquietações, que são tantas
Meus braços em seu corpo, pernas que são braços
Meus quadris uma caixa de anseios...
Meus cachos encharcados pelas chuvas dos sentimentos
Mantemos nossas faces ao vento, sem medo...
E ao final, te deixo de lembrança um isqueiro vermelho
Para que nunca se esqueça que minha revanche é a minha paixão...

Ana Flávia Rocha

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Despedida

Despeço-me de ti hoje, ontem e amanhã.
Vagarosamente, carregando um tijolo no peito,
Despeço-me com medo...

Despeço-me do seu corpo, do seu cheiro, do seu gosto.
Silenciosamente, buscando o meu norte,
Despeço-me sem receio...

Despeço-me dos pronomes possessivos, dos nomes carinhosos, dos poemas saudosos.
Desesperadamente, habitando um corpo vazio,
Despeço-me sem perceber que é de mim que me despeço ao amanhecer...


Ana Flávia Rocha

sábado, 28 de abril de 2012

Tempo de mudanças



Um grito ecoa em meus ouvidos
É tempo de mudanças...
Visto a armadura forjada com o fogo da ambição
Em minhas mãos, a flecha apontada para meus sonhos
Apurados pelo vento da intuição
É tempo de luta...
Já nem sei de onde vem essa força que levanta meu corpo de forma a não envergar
Sei que a batalha que travo é interna
Forças antagônicas que me desafiam a ser uma, sem nada tirar
É tempo de tempestade...
Cavalgo na ventania
Desafiando minha alma
Tecendo minha mais doce poesia


Ana Flávia Rocha

terça-feira, 24 de abril de 2012

Sentido das coisas


Falemos, deliberadamente, de coisas inúteis
Falemos de coisas inúteis para distrair a dor
Coisas inúteis abrem as chaves dos cadeados dos castelos imundos e escuros
Onde vivem seres estranhos
Falemos como seres estranhos, pois o sentido das coisas é só uma fachada...
E a dor é o nome do soldado que guarda o porão onde os mais esquisitos dos seres vivem
Falemos deles e alegremos o soldado que perdeu sua função
O irreal tomou conta do meu mundo e soltou das jaulas meus sentimentos
Cuidadosamente zelados pelo guarda e julgados pelo juiz
E o sentido das palavras perdeu o sentido no dia que senti algo estranho e chamei de saudade
Chorei, gritei e neguei ser vítima dos algozes pensamentos que me prendem às palavras
Peguei o lápis e brinquei de ser deus
E percebi que o algo estranho que sentia era apenas a vontade de ser quem eu sou...

Ana Flávia Rocha